13 | Esse é o autocuidado que a gente precisa
Eu juro que não é mais um item na lista imensa de como se cuidar. Calma, vem comigo que você vai entender no caminho...
📍 San Pedro de Atacama, Chile | Outubro, 2024
Eu tenho o enorme privilégio de escolher temas que quero escrever nos artigos para uma empresa que trabalho. Se hoje estou mais empolgada em ler sobre medicina andina, sugiro essa pauta. Foi aceita, comecei a ler pesquisas e estudos desde os científicos até os espirituais. Porque medicina não se resume a diagnósticos e remédios, pelo menos não a ancestral.
Quando eu falo em autocuidado, o que você imagina? Bem, eu reviro os olhos levemente em imaginar uma lista de tarefas e produtos para preencher as lacunas do meu cuidado comigo mesmo. O meu Pinterest imaginou isso daqui oh:
Primeiro, por algum motivo, aparentemente só mulheres se cuidam. Segundo, essa relação física com o corpo predomina, desde exercício físico, água, alimentação, dormir, se hidratar. Tudo essencial, sem dúvida. Tem até um “corpo, mente e alma” mostrando que tem que cuidar dos três, o combo supremo.
Não vou me profundar no fato de que todas são brancas e muitos autocuidados terem produtos atrelados a marca e consumo, tá bem? Tem até “suplementos essenciais” agora, cházin com microplásticos e lavar o cabelo com um treco esquisito!
Aqui em San Pedro de Atacama aprendi outro significado para autocuidado.
Segundo a cosmovisão andina de como eles enxergam e veem o mundo, nós e a natureza estamos interligadas. Mais do que interligadas, somos um só. Tanto eu, quanto você, fazemos parte de uma comunidade, que eles chamam de Ayllu. Cada um faz tem seu Ayllu, rede de apoio, amores, patota, o seu entorno.
E nesses Ayllus, defendem algo chamado Sumak Kawsay, que é traduzido do kichwa1 ao português como Bem Viver. Movimento coletivo social que preza a comunidade, se organizando politicamente para que todos tenham o que precisam para viver.
Pra nós, da medicina de farmácia, estar doente é quando algo no nosso corpo está doendo, com alguma alteração, não está funcionando como deveria. Porém, segundo a medicina andina, estar doente ou com algum mal-estar é ter um desequilíbrio entre o corpo do indivíduo, o ambiente em que ele está e o mundo espiritual. Por isso, muitas das medicinas incluem não somente chás, mas também rituais para se reencontrar.
Afinal, a vida em comunidade é um dos grandes pilares dos indígenas, dos andinos. Em locais em que a natureza pode ser mais hostil, com a altitude elevada, secas intensas, dias calorosos e noites frias, estar em comunidade e cuidar um do outro garante a sobrevivência de todos.
E não só (sobre)viver, mas viver bem. Pra isso, ninguém vai acumular mais do que precisa para não faltar aos demais. Da natureza, só se tira o essencial e tem que cuidar dela para que ela siga nos cuidando também.
Estamos bem se o nosso entorno também está bem, a natureza e as pessoas. Senão, nós não temos como ficar bem. Autocuidado, cuidar da nossa própria saúde, é cuidar dos outros, da casa, da natureza que nos rodeia. Não faz sentido cuidar somente de si para eles.


Assim como muitos países, o uso de plantas e folhas como medicina é milenar. Algo que eles aprendem na experiência e vão passando de geração em geração.
Quem nunca ouviu a vó falar que para curar a dor de barriga basta um chá de boldo? Ou que pra cólica a folha de amora com camomila é tiro e queda? Dor de garganta, então, limão com gengibre e alho são o combo-todo-poderoso.
A medicina andina trata muito além dos problemas físicos, ela busca olhar para todo o entorno do indivíduo. E, para isso, a cura também é coletiva. Não é apenas tomar um chá em seu quarto, é envolver pessoas próximas nesse cuidado.
Quando alguém está doente, as pessoas se juntam para fazer rituais de cura, para cuidar. Quando alguém padece de muitos acontecimentos ruins em sua vida, eles fazem rituais de limpeza energética para que a pessoa tenha mais leveza nos seus dias e clareza em suas decisões. Dizem até que, se não envolve pelo menos um ritual, então não é medicina andina.
Esse envolvimento do coletivo dá uma sensação de pertencimento ao indivíduo, de cuidado, de carinho, de que está seguro e amparado em seus dias ruins. Reforçando a conexão e amor que eles têm uns pelos outros.
Não sei você, mas quando estou doente, até permito uma ajuda. Um chá, uma comidinha, um remédio. Agora se eu estou emocionalmente ruim, borocoxô, pra baixo, eu tendo a me isolar e nem permitir que se aproximem muito.
Que foi o que aconteceu nas últimas semanas, quando um nó na minha garganta se instalou e eu não sabia desatar por nada. E se eu fizesse diferente? E se você fizer diferente?
Não sei você, mas eu acho que o amor e cuidado um com o outro curam um bocado de coisas nesse mundo doente que estamos vivendo.
Você já cuidou da mente, corpo e alma de alguém hoje?
Alguém cuidou da sua mente, corpo e alma hoje?
Já parou pra imaginar como o mundo seria se autocuidado não fosse individual? Porque eu não paro de imaginar isso e que gostoso é sentir um gostinho de esperança.
Para ler mais sobre
Aún nos cuidamos con nuestra medicina | Um dossiê de entrevistas e pesquisas focado na comunidade andina.
Livro: “O Bem Viver: uma oportunidade para imaginar outros mundos” | O livro que mais me permitiu imaginar um mundo melhor possível.
Quer ler o artigo completo que escrevi e falei da polêmica Folha de Coca? Vai sair em breve aqui no blog da Fui Gostei Trips!
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Ei, você sabia que pode responder o Cartão Postal?
Pois é, assim como em um Cartão Postal da vida real, você pode responder esse email contando algo sobre você, como você enxerga o assunto ou até mesmo discordar de mim, trazer uma visão diferente. Também pode entrar no Substack, ver o que outras pessoas comentaram e deixar a sua resposta.
Não é obrigatório, obviamente, sou apenas uma jornalista curiosa e levemente viciada em saber como as pessoas enxergam o mundo.
Esse foi mais um Cartão Postal | O mundo em doses de histórias, um caderno de viagem compartilhado. Quando menos esperar, um Cartão Postal no seu email. Escrito por Lanna Sanches.📮✉️
Com amor e um novo olhar pra autocuidado,
Ou quíchua, língua indígena muito falada nos Andes até hoje.
Li a primeira frase desse cartão postal e já abri um sorriso!
Que texto incrível! Autocuidado coletivo eu tô conhecendo agora morando em hostel, muito necessário mesmo. Inclusive fiquei curiosa também em saber mais sobre o tema e ler os seus textos dessa empresa hehe