23 | Despedir para recomeçar

Acho difícil fazer algo tão desconfortável assim e não sair diferente.

Sou uma pessoa muito nostálgica. Gosto de ficar relembrando histórias do passado, mergulhar em cartinhas de amigos e antigos amores, ver as fotos de cada fase da minha vida. Tenho saudades de tantas delas… sou nostálgica, eu avisei.

Nem sempre a gente sabe que temos uma fase de nossas vidas se encerrando para outra iniciar. Não somos tão claros como a natureza que floresce ou derruba suas folhas para avisar o que se foi ou o que virá. É preciso estar atenta, se ouvir. Nem sempre estou.

Outono

Sabe quando você olha pra trás e enxerga momentos que foram pontos de virada na sua vida? Aqueles que você sabe que existe um eu-antes e um eu-depois?

Nem sempre sabíamos que estava começando algo novo, só seguimos vivendo. Percebemos quando olhamos pra trás. Só que eu sou uma pessoa nostálgica apaixonada por despedidas. E agora eu sei que tem uma nova estação na minha vida se iniciando, eu sinto.

Essa viagem sozinha está sendo uma despedida de mim mesma. De verdade, consigo sentir os meus dias mais curtos e minhas noites mais longas. Antes mesmo de começar essa viagem eu fiquei horas e horas deitada no chão lendo e relendo diários antigos da minha vida.

Agora, com os pés na areia, sozinha, penso em toda a água que rolou até eu chegar aqui. Viajando de carro pelas praias que tanto me fizeram renascer em momentos tão desafiadores, hoje é só cenário das últimas palavras desse caderno, dessa minha estação.

Mergulho no mar e quero decorar cada segundo. O salgado do mar invadindo minha boca, a textura da areia molhada entre meus dedos, o cheiro de queijo coalho passando, os sons do quebrar das ondas misturado com gargalhadas de crianças. Que saudades vou sentir disso… que saudades já sinto disso…

Já tô com saudades da minha quebrada América Latina 💛 o mar, a minha árvore favorita [amendoeira-da-praia, que é asiática?], e as clássicas cadeiras.

Primavera

Em algumas semanas embarcamos juntos -eu e careca- em uma jornada sem data de volta. Para países que não entendemos o alfabeto e não fazemos nem ideia dos costumes. De Portugal até a China por terra, sem pegar avião.

Cê tem noção do vuco-vuco que vai acontecer dentro de mim? Porque eu não consigo nem imaginar…

Quer entender o QUÃO pronta estou pra essa nova etapa? Troquei de celular, não passei as fotos, nem notas, gravações de voz, ou sequer o backup de WhatsApp. Começar do zero. Leve.

É assim que me sinto. Uma folha de caderno em branco.

Lembro de quando isso me apavorava: ter todas as opções na mão só esperando a minha decisão. Mas, como prefiro ter certeza do que decidir, esperava muito para começar a colorir e rabiscar meu novo caderninho, da nova fase que tô vivendo. Me apegava nos caderninhos preenchidos como a nostálgica pessoa que sou.

Agora, não mais, estou admirando meu caderno em branco e apenas encantada. Encantada no sentido mais mágico da palavra, maravilhada, enfeitiçada. Eu não faço ideia do que virá com o meu próximo grande voo, o que serei eu quando retornar para o ponto de partida.

Acho difícil fazer algo tão desconfortável assim e não sair diferente. Seria muito triste passar por tudo que vou passar (que nem sei o que é ainda) e ser a mesma pessoa. Por isso, sinto que um fim de ciclo se aproxima.

Precisava desses dias de despedida de mim mesma, viajar sozinha para um lugar que sempre me ajudou a recomeçar: o mar. Estar sozinha me ajuda a me ouvir, me sentir. Precisava passar um tempo a sós com essa minha versão, me despedir do que sei, do que acho que sei, das minhas certezas e visão de mundo.

Só quando soltar todas minhas folhas no chão que estarei disposta, de coração aberto, para recomeçar. E eu tô, só falta me despedir de algumas folhas antes delas caírem.

Sim, pulei o inverno porque eu vou pular literalmente de outono para primavera em algumas semanas. A chegada do outono veio para me lembrar que tem um outono aqui dentro de mim, e eu não faço ideia de como será minha primavera. Nada mais simbólico do que sair de um lugar que está entrando em repouso, para outro que está renascendo.

Vídeo do Felipe Savietto sobre decidir ou ter certeza, vale a pena ouvir.

Com amor, da futura frorzinha da primavera,