11 | Ansiedade é falta de confiança
Entre o “abrir mão e confiar no fluxo da vida” e o “tentar prever cada passo”, um abismo.
Digito e erro algumas teclas, minhas mãos estão tremendo. Estou ansiosa sem precisar estar, eu sei disso. Eu tenho total consciência disso. Só que meu corpo não me escuta, é como se ele e minha mente estivessem separados e é por isso que fervo. Sinto cada milímetro da pele borbulhar. Carne viva. Dói. Queima.
Eu estou feliz, não deveria estar ansiosa.
O olho esquece de piscar, o pulmão desaprende o ritmo de respirar, o coração escala uma montanha mesmo estando parada. Será que não sei mais sentir a diferença entre ansiedade e empolgação? De tanto misturar e confundir, esses meus divertidamente viraram um só? Estou empolgada, estou animada, estou viva. Por que ansiosa?
Medo de algo que já conheço
“Eu sinto que não tenho direito de sentir o medo que eu sinto” | Tamara Klink em Nós, o Atlântico em Solitário
Li essa frase no clube do livro do Viajantes Sem Pauta. Essa frase me agarrou forte, daquelas que você até fala um ‘aaai’ em voz alta. Fechei o livro e deixei a dor resmungar. Onde dói? Por quê? Me conta.
Viajo há 7 anos, e parece que eu faço isso com as mãos nas costas. Tudo é fácil, simples, leve, já sei de cor e salteado. Logo, não tenho direito de sentir medo de algo que vivo há tanto tempo. Só que o meu corpo sente como se tivesse com as mãos nas costas, os pés amarrados e os olhos vendados. Por quê? POR QUÊ?
Não sou a pessoa do se joga e confia no fluxo da vida, tampouco sou a pessoa que tenta controlar o futuro a cada pequeno passo. Sou um meio-termo estranho, uma café com leite em ambas categorias. Se bem que preciso ser honesta com você - e mais ainda comigo, estou mais inclinada para a segunda do que para a primeira.
Eu definitivamente não consigo me jogar e confiar no fluxo da vida por inteiro. Não sei pular de cabeça sem antes colocar os pés na água, testar se dá pé.
Até engraçado, porque sinto que estou cada vez pior em tentar “prever” ou estruturar os próximos passos. Cada vez mais a vida me leva, e cada vez mais amo o ritmo da dança que a vida toca. Mas ainda fico de olhos abertos, atenta. Perdendo o ritmo e pisando no meu próprio pé sem querer.
E esse descompasso é ditado pelo medo - ou a ansiedade - se fantasiando de outras sensações. Quando ele coloca uma máscara de “prudência” e me oferece saídas para não fazer algo, para me impedir de me arriscar, machucar, decepcionar. Quer que eu apequene meus sonhos para a ansiedade caber. Nisso, tenho que me apequenar junto, sonhar mais baixo, comprimir minha existência.
“E se você adiasse para quando estiver se sentindo mais preparada?” Mesmo o medo sabendo que nunca vou me sentir pronta, ele continua sussurrando lendas para me fazer ficar parada onde estou.
Não se mova
Não quero permanecer onde estou, como estou. Quero andar, preciso andar. Me expandir, sonhar sem limites, sem ser migalha de mim. Mais ainda, quero viver o que não imaginei ser possível viver. Sei que “o inesperado é melhor que o planejado”. Ele só acontece.
Tanto que carrego comigo uma resposta na manga sempre que me interrogam sobre planos: “é muito cedo para tanta certeza”. Não tenho como - e nem quero - saber tanto, por isso não respondo com firmeza. Essa frase foi dita por uma das minhas melhores amigas, minha mestra-guru na dança do fluxo da vida, e desde então virou um mantra.
Nisso, sigo mais não-sabendo do que sabendo do meu futuro. Futuro é janeiro, tá? Não de quando ficar velha, é de curto prazo, é da próxima semana. Mesmo esse futuro-quase-presente, desconheço como será.
Essa pode ser até uma das faíscas que acendem minha ansiedade. Não saber o terreno que pisarei, a cama na qual dormirei, a rotina que adaptarei, ou sequer a língua que falarei. Conhecendo bem a peça, sei que ela pode surgir de fogueiras diferentes. Seja o perfeccionismo, o medo de errar, julgamento dos outros, imaginar os piores cenários, se decepcionar, cair de cara.
Recentemente descobri que uma das minhas chamas é a confiança. Mas o problema não é a falta de confiança na vida, é que…
Eu não confio em mim
Em uma daquelas trocas de longos áudios com outra amiga, ela me descreveu uma lista de avalanches. Relacionamento novo, mudança de país, lançamento de livros, cirurgia de alguém querido… e a lista continuava. Perguntei - obviamente - como ela estava se sentindo com tudo isso acontecendo ao mesmo tempo. Ela, com a paz de não sei de onde, responde:
“Ai amiga… Nada é mais reconfortante do que cultivar a certeza de que eu e você temos dentro de nós TODOS os recursos necessários para realizarmos nossos movimentos de alma. Não importa o que esteja por vir, você dá conta, você tem os recursos e ferramentas para lidar com a experiência.”
Algo dentro de mim apertou, soltei mais um ‘aaai’ em voz alta. Dessa vez, alcançou até o coração. Meu cérebro jura juradinho que alguém me beliscou de verdade, porque eu senti. E se dói, tem algo aí. Talvez eu não confie em mim mesmo, pelo menos não do jeito que ela descreveu.
Será que vou ter as ferramentas necessárias?
Será que vou conseguir adaptar?
Será que vou conseguir lidar com as consequências?
P0rr4, SIM! Quando me questiono se confio em mim mesma, nas minhas decisões, respondo: “é óbvio, já viu o tanto de coisa que tu passou sozinha, mulher?”
Acho que a ansiedade causa amnésia. Não tenho nenhuma comprovação científica, só sinto que ela me faz esquecer de quem eu sou e de tudo que já fui capaz de fazer. Quando paro para pensar no que vivi viajando sozinha ou acompanhada, até me assusto.
“Eu que fiz isso?” Sim, meu amô, foi você. Sempre foi você.
A ansiedade se apequena quando lembro da minha jornada até aqui, dos meus saltos no escuro, de quando mergulhei de olhos fechados. Sai viva, mais inteira de mim do que jamais fui. Seja sozinha ou com a mão de quem está comigo quando não tive as ferramentas necessárias.
Me lembrar disso, de quem sou e da minha rede de amores, foi o que tirou uns nós da garganta, aqueles que me impediam de respirar. Agora o ar volta a fluir aqui dentro, me expande. A vida volta a me convidar a dançar, e agora sei que não importa o ritmo, posso até fingir que sei o gingado.
“Esquecer é o que dói, e eu só sou o que lembro”
Trecho da música Minha Voz de Versos que Compomos na Estrada e Me Chamo Antônio
Me lembrei que não importa o que aconteça, vou saber me virar. E se não tenho o que preciso para tal, vou saber me adaptar, ou pedir ajuda para alguém que tenha as ferramentas. Não ando só, ninguém anda.
Escrevo esse final de texto com as mãos mais calmas, assim como o meu coração e a respiração. No fim, essa falta de confiança no fluir da vida era, na verdade, falta de confiança em mim mesma.
Como antídoto, preciso me lembrar de abrir mão, soltar. Não me esquecer de quem sou, de que sou maior do que imaginava poder ser. Fechar os olhos para dançar, rodopiar com cabelos soltos. Confiar que vou saber me segurar quando pular de cabeça. Eu sei que vou, só preciso me lembrar. E lembrar que mesmo quando cair, eu sei me cuidar.
Decidir quando tiver que decidir. Adaptar quando tiver que adaptar. Não viver antes da hora, e nem duvidar mais de mim mesma. Lembrar de toda a minha capacidade, e que eu posso ir muito, mas muito além do que imagino.
Porque foi assim até aqui: vivi muito mais alto do que me permiti sonhar. Sempre foi você. Confia.
Sim, eu tô falando com você. Confia.
Com amor, menos ansiedade que antes e mais confiança,
Muito bom te ler! Sim, acredito que tem isso de falta de confiança, também sofro de ansiedades por esses tempos e nunca fui tão assim... mas penso também que tem um pouquinho de mundo, de sensibilidade com o nosso tempo, que anda em crises...
Passei a semana pensando no medo de voltar a viajar sozinha, mesmo sempre tudo tendo dado certo nas últimas viagens, a ansiedade tem me passado a perna ultimamente. Então vem a senhorita Lanna com esse abraço no meu coração!
Eita mulher, se tu soubesse o quanto me inspira!
(E Janeiro volto pra estrada, tá decidido por aqui) 💛